‘Transição energética é o desafio civilizatório do século’, diz especialista na Brazil Climate Week

‘Transição energética é o desafio civilizatório do século’, diz especialista na Brazil Climate Week
23 de setembro de 2025

Em evento do Pacto Global em Nova York, Mekala Krishnan, sócia do McKinsey Global Institute, mostra a dimensão do desafio para transformar uma infraestrutura que ‘funciona extremamente bem’ mas polui

Transformar em décadas um sistema energético construído e otimizado ao longo de séculos. Esta é a síntese do maior desafio civilizatório contemporâneo, segundo Mekala Krishnan, engenheira e sócia do McKinsey Global Institute.

Em uma apresentação exclusiva durante o evento SDGs in Brazil 2025, evento promovido pelo Pacto Global da ONU, durante a Brazil Climate Week, em Nova York, Krishnan apresentou dados sobre a intersecção entre trabalho, clima e equidade, que revelam os reais desafios da transição para emissões líquidas zero.

Para ilustrar a dimensão do sistema atual, a executiva mostrou que os oleodutos e gasodutos de petróleo e gás hoje cobrem a distância equivalente a duas viagens de ida e volta entre a Terra e a Lua.

O planeta conta ainda com 60.000 usinas de energia, principalmente movidas a gás e carvão, “em um mundo onde ainda não temos acesso suficiente à eletricidade em todo o globo”.

Nas estradas, circulam 1,5 bilhão de veículos, majoritariamente equipados com motores de combustão interna.

“A produção industrial global atinge 7 bilhões de toneladas anuais de materiais como aço, cimento, plásticos e amônia, “em grande parte com processos de altas emissões”.

Um sistema eficaz, mas problemático

O paradoxo reside no fato de que a infraestrutura energética atual, apesar dos problemas ambientais, “funciona extremamente bem”, reconhece Krishnan.

A energia fóssil é “fácil de transportar, fácil de aumentar e diminuir, pode produzir calor alto” – características fundamentais para processos industriais como a produção de aço.

Contudo, as falhas do sistema atual são incontornáveis. “Cerca de 85% das emissões de dióxido de carbono vêm do sistema energético, seja da produção ou do consumo de energia”, explica a pesquisadora.

Isso significa que quase toda a poluição climática global tem origem tanto na geração de eletricidade em usinas movidas a carvão e gás quanto no uso cotidiano de combustíveis fósseis, desde carros nas ruas até fornos industriais para produzir aço e cimento.

O desperdício também é substancial: “cerca de dois terços da energia são perdidos em todas as transformações ou etapas pelas quais passamos ao produzir e usar energia”.

Segundo Krishnan, essa ineficiência ocorre em múltiplos pontos – na conversão do carvão em eletricidade, no transporte pela rede elétrica, na transformação de petróleo em combustível e até no motor dos veículos, onde grande parte da energia vira calor perdido em vez de movimento.

Eletrificação como eixo central

Para a engenheira, a solução passa necessariamente pela construção de alternativas que mantenham a eficácia do sistema atual enquanto reduzem drasticamente as emissões. O que parece uma obviedade, mas não é.

“Precisamos substituir todas as coisas que construímos no passado por novas formas de produção de energia, e precisamos garantir que funcionem”, destaca Krishnan.

E o desafio não está apenas em criar tecnologias limpas, mas em assegurar que elas repliquem todas as vantagens do sistema fóssil.

A eletrificação surge, neste contexto, como resposta central. “No coração da transição energética está o sistema elétrico”, afirma a executiva.

Contudo, eletrificar uma economia inteira significa redesenhar desde redes de distribuição até processos industriais centenários.

A complexidade se multiplica quando se considera que essa transformação tecnológica não ocorre no vácuo. Implica repensar diversos setores simultaneamente, gerando impactos diretos na criação, modificação e extinção de postos de trabalho em escala global. Assim, também a agenda de empregos se torna inseparável da agenda climática.

Para Krishnan, compreender essa intersecção é fundamental para navegar a mudança de forma que seja não apenas ambientalmente sustentável, mas também socialmente equitativa. A engenharia do futuro energético é, inevitavelmente, a engenharia do futuro do trabalho.

Fonte: Exame.
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