País eleva investimento em energia para atrair data centers

País eleva investimento em energia para atrair data centers
25 de julho de 2025

Com matriz elétrica considerada ideal para centros de dados, Brasil garante suprimento do sistema interligado e prevê aportes de R$ 3,2 trilhões no setor energético

avanço da digitalização, puxado por IA (inteligência artificial), IoT (internet das coisas) e transações de criptomoedas, indica uma urgência global por energia firme. Com o uso dessas tecnologias e uma sociedade cada vez mais digital, o consumo de eletricidade deve dobrar até 2026, passando de 460 TWh (terawatts-hora), registrados em 2022, para 1.000 TWh no ano que vem, conforme o relatório Electricity 2024, da IEA (Agência Internacional de Energia, da sigla em inglês).

Esse aumento da demanda por energia tem relação direta com o crescimento da indústria de data centers –centrais que armazenam e processam o alto volume de dados das novas ferramentas, como o ChatGPT. Uma interação na plataforma, por exemplo, pode requerer 10 vezes mais eletricidade do que uma busca no Google, de acordo com o comparativo feito pela organização americana Epri (Eletric Power Research Institute).

No Brasil, a demanda energética para suprir esse setor de informação já triplicou. Subiu de 510 GWh (gigawatts-hora) em 2021 para 1.620 GWh em 2023, segundo o Anuário Estatístico de Energia Elétrica – 20 Anos, publicado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética).

Indicadores da empresa, referentes ao fim de 2024, evidenciam, ainda, que os mais de 180 data centers implementados no país responderam, juntos, por uma margem de conexão de 800 MW (megawatts), correspondente a 1% da carga total disponibilizada pelo SIN (Sistema Interligado Nacional). Esses últimos montantes foram repassados pelo presidente da EPE, Thiago Prado, em entrevista ao Poder360.

Leia mais no infográfico sobre o impacto dos data centers na mudança do cenário energético.

Líder do ranking latino-americano em número de data centers, o Brasil emerge, diante desses e de outros números, como um potencial protagonista na corrida para atrair novos empreendimentos, principalmente em virtude da matriz elétrica diversificada e firme.

Até 30 de junho deste ano, o MME (Ministério de Minas e Energia) registrou 53 projetos de data centers requisitantes de acesso à rede básica do SIN nos Estados da Bahia, Ceará, São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul. O quantitativo é 341% maior que o constatado na mesma data de 2024 –quando 12 processos, no total, estavam inscritos no MME. Das 53 iniciativas, 11 estavam em análise, 23 apresentavam-se em fase de documentação inicial e 19 já tiveram publicadas as portarias que reconhecem o ponto de conexão.

Por que o Brasil pode ser protagonista

Nesse cenário de crescimento da indústria de data centers, o setor de energia torna-se cada vez mais estratégico. Este deve atrair R$ 3,2 trilhões em investimentos até 2034, distribuídos entre geração, transmissão, petróleo, gás natural e biocombustíveis, de acordo com as projeções da EPE, consolidadas no PDE (Plano Decenal de Expansão de Energia) 2034. Uma parcela significativa desses recursos virá da indústria de tecnologia.

Segundo Thiago Prado, da EPE, e outros especialistas do setor energético entrevistados pelo Poder360, na disputa para atender a essas empresas com suprimento firme, o Brasil apresenta uma relevante vantagem competitiva.

Trata-se da matriz elétrica diversificada, que mescla fontes renováveis e fósseis em sua composição, ideal para garantir segurança energética, sem intermitência, tão necessária às operações dos empreendimentos.

A pluralidade da matriz brasileira é um ativo significativo. O Brasil tem potencialidades para assumir um papel relevante. Seu posicionamento em muito se deve à expectativa de manutenção de elevado grau de renovabilidade da matriz, à sua posição como a maior economia da América Latina e à sua localização geográfica, podendo servir como hub estratégico para empresas que desejam fornecer serviços de nuvem e dados de latência mais baixa para países vizinhos. Além disso, há robusta infraestrutura elétrica e de telecomunicações, em crescente expansão”, explicou Prado.

Tais características podem ser determinantes para a tomada de decisão dos investidores em escolher o país para receber essas instalações, observa Luiz Carlos Ciocchi, consultor do setor de energia e ex-diretor-geral do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico).

Na avaliação dele, a matriz nacional, tanto elétrica quanto energética, é ideal para sustentar essa atratividade, construída a partir de 3 pilares: segurança energética, facilidade de acesso e sustentabilidade. Nesse arranjo, explica, contribuem decisivamente os investimentos das empresas privadas, com fontes firmes (como as usadas por termelétricas movidas a combustíveis fósseis) e renováveis (como as solares e as eólicas) complementando-se na oferta interna.

“Uma matriz totalmente renovável pode não ser tão segura. Uma matriz muito segura pode não oferecer um preço adequado para o consumidor. O Brasil tem uma posição privilegiadíssima nesse cenário. Nossa matriz é 90% renovável, um índice a que outros países do mundo pretendem chegar somente em 2050, e olhe lá.  Temos, sim, condições excepcionais hoje para fornecer essa energia demandada, independentemente de sazonalidades, de intermitência, de tempo”, disse Ciocchi.

A amplitude das fontes operadas pelas usinas é fator-chave também destacado pelo presidente do IPE (Instituto Pensar Energia), Marcos Cintra, como um diferencial para elevar o grau de confiabilidade do sistema. O Brasil dispõe de uma matriz elétrica composta por fontes hídrica (52,16%), eólica (15,81%), fóssil (14,37%), biomassa (8,38%) e solar (8,24%), conforme detalhamento informado pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Diante do cenário exposto, Cintra ressalta como ponto de atenção os padrões “extremamente mais rigorosos” exigidos pelos data centers para o fornecimento, no comparativo com outros segmentos atendidos. “Um data center só tolera [um episódio de] falta de energia em 1 ano inteiro, e durante 5 minutos. Os requisitos para atender a uma casa, 1 escritório, uma indústria, são bem menores. Nesse sentido, a diversificação da matriz consiste em elemento muito importante. As fontes cooperam e dialogam entre si para produzir com mais firmeza e segurança”, explicou Cintra.

A segurança do suprimento é ainda mais relevante quando se observa que as projeções globais preveem que 1/5 da energia produzida do planeta será destinada a data centers até 2030.

O executivo menciona, ainda, a importância das fontes firmes quando há adversidades climáticas que impactam a atuação de plantas movidas a fontes como solar, eólica e hídrica. “O país tem, assim, potência, aliada à firmeza e baixa emissão de poluentes, algo difícil de encontrar no mundo para cumprir os requisitos de energia firme”.

 Leia mais no infográfico sobre o avanço dos data centers no consumo de eletricidade.

Setor energético é estratégico para avanço

Na expectativa por definições governamentais para o avanço do mercado de data centers, o setor energético atua para prover o suprimento necessário em prol da segurança energética.  Em relação ao fornecimento elétrico firme, Marcos Cintra e Luiz Carlos Ciocchi destacam a representatividade majoritária dos investimentos privados de usinas.

Temos metas de redução [de emissões de poluentes] que o setor tem levado muito a sério. Esse equilíbrio entre as fontes de geração também contribui para um fornecimento confiável e seguro, com baixa emissão e com modicidade tarifária [princípio que defende a acessibilidade da população à energia elétrica]”, disse Cintra.

Para Ciocchi, cabe ao governo organizar o setor e as entidades representativas para trabalharem no sentido de compor a ambiência operacional propícia à instalação de novos negócios, no embalo das mudanças proporcionadas pelas indústrias. “As usinas termelétricas hoje emitem menos do que já emitiram no passado. As usinas a carvão também já não são como eram antigamente”.

Na Âmbar Energia, por exemplo, o suprimento energético é produzido por meio de múltiplas fontes. “Atuamos por meio de um portfólio plural, para contribuir para uma matriz energética não só confiável, mas também resiliente. Essa diversidade é essencial para atender às demandas atuais e futuras do Brasil, como a instalação de data centers e a transição energética sustentável”, explicou o presidente da empresa, Marcelo Zanatta.

Divulgação/Âmbar EnergiaUsina termelétrica da Araucária, no Paraná, é uma das 39 plantas da Âmbar Energia, empresa com capacidade instalada total de 4 GW para atender ao sistema.

A companhia opera com 39 usinas, com capacidade instalada total de 4 GW. São 15 plantas movidas a gás natural, 5 fotovoltaicas, 16 PCHs (pequenas centrais hidrelétricas), uma usina a biogás, uma a biomassa e uma a carvão mineral. As unidades estão localizadas no Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Paraná, Amazonas, São Paulo, Goiás, Minas Gerais e Santa Catarina.

Leia mais no infográfico sobre as vantagens da matriz diversificada e os investimentos do setor.

Leilões em outubro

Para além da renovabilidade e da diversidade da matriz elétrica, Thiago Prado reitera a importância da robustez do Sistema Interligado Nacional. Para expandir a rede do SIN, leilões de transmissão de energia estão sendo preparados pelo governo. O próximo certame, previsto para outubro deste ano, envolve, entre outros planos, projetos no Estado de São Paulo. “É um importante ganho de margem para conexão de data centers, principalmente na região de Barueri, Santana do Parnaíba e parte da capital”, afirmou o presidente da EPE.

Somente para o Estado de São Paulo, entre obras a serem autorizadas e licitadas, a estimativa de investimentos é da ordem R$ 850 milhões em infraestrutura de transmissão, acrescenta o presidente da EPE.

“Adicionalmente, nos estudos de transmissão que temos em andamento, certamente teremos novas expansões, tanto em São Paulo quanto em outros Estados. Todos vão compor os leilões de transmissão a partir de 2026″, complementou Prado.

Considerando a maior procura por conexão em território paulista, Thiago Prado informa que já existem obras planejadas para atendimento à parte de crescimento de demanda. “Podemos dizer que essas obras podem liberar cerca de 1,5 GW de margem para conexão de novos projetos. Existem, ainda, 2 estudos em andamento que deverão recomendar obras para viabilizar margem adicional de conexão para cerca de 4,5 GW. Os estudos abrangem a Região Metropolitana de São Paulo e outras regiões no entorno de Campinas e Jundiaí”.

A garantia de acesso ágil ao grid é fundamental, avalia Prado, por se tratar de uma das principais preocupações dos players privados e um desafio para os órgãos governamentais. A reivindicação tem relação com a celeridade da disponibilização da infraestrutura elétrica, especialmente a instalação com alta densidade energética, que pode chegar a 1 kW/m².

“É uma discussão que outros países elegíveis a receber investimentos de data centers também têm passado, uma vez que há um descompasso temporal entre a construção de um data center [2 a 5 anos] e a construção de infraestrutura elétrica para atendê-lo. No Brasil, para uma nova linha de transmissão, o processo pode durar pelo menos 7 anos”, exemplificou.

A superação desse desafio, de acordo com Prado, passa por minimizar os efeitos de movimentos especulativos de investimento de infraestrutura e manter um constante diálogo com investidores para maior integração de suas expectativas no planejamento elétrico.

Novo regime prevê R$ 2 tri

Com a expansão da infraestrutura e a liberação de gigawatts para novos projetos, o panorama para data centers no Brasil tem sido objeto de debates nos terrenos legislativo e tributário. É nesse quadro que uma MP (medida provisória) com o ReData (Regime Especial de Tributação para Centro de Dados) vem sendo anunciada pelo governo federal como mecanismo para atrair os empreendimentos por meio de incentivos fiscais. Com os estímulos, o Executivo pretende captar R$ 2 trilhões em investimentos no país em 10 anos.

Para obter esses recursos, a MP propõe a desoneração de bens de capital e máquinas de equipamentos e a redução de impostos de importação sobre equipamentos de TI (tecnologia da informação).

No Congresso Nacional, a regulamentação dos data centers é abordada no PL (projeto de lei) 3018 de 2024, que busca estabelecer regramentos para os empreendimentos dedicados à inteligência artificial. A matéria está em tramitação no Senado e, posteriormente, deve passar pela Câmara dos Deputados.

Tanto o arcabouço jurídico quanto o arranjo tributário são apontados pelos especialistas como mecanismos para acelerar a instalação de data centers no país, um setor que tem pressa, definiu Luiz Carlos Ciocchi.

“A regulação dos data centers é urgente. A tomada de decisão desses investimentos é muito rápida. Um data center pode ser instalado aqui, na Índia, na China, nos Estados Unidos, na Europa e em qualquer lugar. Precisamos ter mecanismos para garantir que parte dessas empresas decidam fazer seus investimentos aqui no Brasil”, afirmou o consultor.

Conforme Marcos Cintra, a previsibilidade da demanda de energia pelos centros de dados é propulsora do rearranjo regulatório e legislativo. “Isso é benéfico porque vai valorizar as fontes firmes”.

Atentar-se para as peculiaridades da atividade dos data centers é outro cuidado necessário apontado pelo executivo para conferir atratividade a esse mercado, trazendo regras mais específicas para as instalações.  “Os data centers precisam ter regras próprias. O setor precisa receber uma prioridade regulatória, por exemplo, em licenciamento ambiental. É um ativo de segurança nacional, porque dados são o novo ouro da humanidade”, destacou Cintra.

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Fonte: Poder360.
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