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Chineses indicam nova onda bilionária de investimentos em energia no Brasil

Somente nos primeiros cinco meses do ano, foram anunciados cerca de R$ 65 bilhões em novos aportes, de empresas entrante e de grupos já operando no país

FONTE: Valor Econômico

O interesse chinês no setor elétrico brasileiro voltou com força em 2023. Nos primeiros cinco meses do ano, os anúncios das companhias chinesas em energia somam mais de R$ 65 bilhões (US$ 13 bilhões), segundo levantamento do Valor. O país já é um dos principais investidores no segmento. Entre 2007 e 2021, as elétricas chinesas puseram no país montante de US$ 32 bilhões.

O valor pode aumentar bastante com a previsão de megaleilões, expansão de energias renováveis, necessidade de eletrificação e crescente interesse em hidrogênio verde, o que têm feito com que diversas empresas chinesas anunciassem uma série de memorandos de entendimentos e novas parcerias. Se antes a principal estratégia era via fusões e aquisições, agora a possibilidade por meio de projetos novos (greenfield) aumenta.

Os anúncios mais agressivos ficam por conta das empresas controladas pelo governo de Xi Jinping. O vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, estiveram recentemente com o presidente da Energy China International, Lyu Ze Xiang, e anunciaram que a companhia pretendeinvestir cerca de US$ 10 bilhões (aproximadamente R$ 50 bilhões) em transmissão e energia eólica.

Silveira também esteve com embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, e sua comitiva, e afirmou à reportagem que o país é um parceiro importante e tem buscado busca estreitar relações.

A também estatal PowerChina International e a Pontoon Clean Tech celebraram uma operação para investir cerca de R$ 1,8 bilhão (US$ 360 milhões) em projetos de geração solar de grande porte em Mauriti e Milagres, no Ceará.

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A CEO da Spic Brasil, Adriana Waltrick, nota um cenário político pragmático com condições de crescer. A empresa firmou memorandos de entendimentos para projetos eólicos, solares e hidrogênio verde. “O Brasil é o principal mercado para a Spic Global e o país com maior capacidade instalada fora da China (…). A Spic pretende crescer 20 GW ao ano em todo o mundo, sendo que o Brasil pode ser o destino de 10% deste crescimento”.

Segundo a executiva, a principal avenida de crescimento da companhia será via fusões e aquisições, já que a empresa está investindo em dois projetos solares que somam quase 2,5 GW de capacidade, com aportes estimados de US$ 2 bilhões (R$ 10 bilhões). Até 2025, a meta da subsidiária local da chinesa State Power Investment Corporation (Spic) é chegar a 5 GW.

A recente visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à China foi marcada por vários encontros com empresários que atuam principalmente em eólica e solar, expansão da malha de transmissão e mobilidade elétrica. Lula esteve com o presidente da State Grid, Zhang Zhigang, uma das promessas nos leilões de transmissão que devem movimentar cerca de R$ 50 bilhões este ano no Brasil.

Além de diversas concessionárias e linhas de transmissão, a State Grid controla a CPFL, que já manifestou interesse em comprar a Enel Ceará (antiga Coelce) num negócio que se der certo pode chegar em até R$ 8 bilhões e se tornar o maior negócio de 2023.

Ainda no segmento de transmissão, Furnas e a State Grid manifestaram interesse em desenvolver um projeto de revitalização do linhão de Itaipu. A Motrice Soluções em Energia e a China Gansu International Corporation for Economic and Technical Cooperation Company firmaram memorando na área de energias renováveis.

A relação dos dois países estava balançada porque o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores atacaram publicamente a China em diversas ocasiões por questões ideológicas. A diretora executiva do Conselho Empresarial Brasil-China, Cláudia Trevisan, explica que em um setor com atuação de muitas estatais chinesas, uma sinalização do atual governo de que as relações bilaterais são valorizadas ajuda a destravar investimentos.

Lula também esteve com o fundador da gigante dos carros elétricos BYD, Wang Chuanfu, que prometeu investir R$ 10 bilhões até 2025 em frentes de negócios que incluem também energia solar. A empresa chegou ao Brasil em 2013 para montar veículos, mas também em energia renovável com fabricação de placas fotovoltaicas. Hoje já possui uma fábrica em Campinas (SP) e planeja outra, mas não revela quanto investirá.

“A forma do chinês de fazer negócio se baseia na confiança e o governo tem que olhar assim para que as empresas venham investir”, diz o diretor institucional da BYD do Brasil, Marcello Schneider.

Para o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), Nivalde de Castro, o Itamaraty e o Ministério da Economia têm essa percepção e adotam política externa mais pragmática, já que investimentos em infraestrutura são de longo prazo.

“As empresas chinesas fazem investimentos no Brasil, diferentemente de empresas americanas, e isso acontece notadamente no setor elétrico (…). Este movimento de uma economia em ascensão, como a China, fortalece a economia brasileira e mantém o Brasil com poder de neutralidade”.

Já o professor de Relações Internacionais da FGV, Oliver Stuenkel, tem a percepção de que empresas chinesas estão dando ênfase aos países da América Latina em função das crescentes barreiras geopolíticas entre o ocidente e a China. “Isso explica porque a América Latina recebeu mais investimento chinês do que os EUA no ano passado (…). Em médio e longo prazo, a relação com o ocidente deve piorar e a relação com a América latina, do ponto de vista geopolítico, é mais segura”, explica.

É o caso da Huawei, que teve a venda de equipamentos vetada nos EUA, mas vem conquistando espaço no Brasil. O mais recente anúncio ocorreu em maio, quando a empresa fechou com a Rio Alto contrato para uso de inteligência artificial em usinas solares. O vice-presidente de Relações Públicas da Huawei para América Latina e Caribe, Atilio Rulli, diz que para além de aspectos geopolíticos, ele sente o ambiente de negócios mais favorável.

“Os investimentos da Huawei em energia começaram no Brasil há quase três anos quando estruturamos a unidade de negócios. Os investimentos já vêm ocorrendo e sem dúvida foram impulsionados com este novo cenário”, diz.