Abertura de mercado é janela de oportunidades para solucionar sobrecontratação, afirma Abraceel

FONTE: Energia Hoje

A abertura total do mercado livre pode permitir que o governo aproveite uma janela de oportunidades para solucionar a questão dos contratos legados, causadores em potencial da sobrecontratação, preocupação das distribuidoras sobre o destino desta energia, sem onerar o consumidor, avalia Rodrigo Ferreira, presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel).

Segundo ele, a janela em questão envolve contratos de energia relativos a termelétricas, que se encerrarão a partir de 2023, a usinas da Eletrobras, que passarão pela descotização após a privatização da companhia, e às cotas de Itaipu, cujo acordo binacional expira no ano que vem. Eletrobras mais Itaipu correspondem a 13 GW.

A proposta do PL 414/2021, que tramita na Câmara dos Deputados prevê a abertura total do mercado para a alta tensão (grupo A) em 2024 e para a baixa tensão (grupo B) em 2026 –ou seja, a liberalização total ocorreria em 42 meses.

“É uma janela de oportunidades para resolver a sobrecontratação. [A proposta] só traz benefícios, não traz ônus ao consumidor”, disse Ferreira ao EnergiaHoje.

O executivo salientou que 31% do portfólio das distribuidoras corresponde a contratos térmicos (2,5 GW), às cotas-parte de Itaipu com concessionárias do Sul, Sudeste e Centro-Oeste (6,4 GW), que poderiam ser licitados com o fim do Anexo C, e às cotas das hidrelétricas da Eletrobras que tiveram renovação condicionada das concessões em 2013 (6,6 GW) – e que elevaram a sobrecontratação.

Dados de dois estudos realizados pela Abraceel, divulgados nesta semana, indicam que a abertura do mercado livre em direção à baixa tensão pode proporcionar uma redução média de 27% no preço da energia elétrica, com impacto de 0,61% no IPCA, índice oficial de inflação brasileira.

Essa redução corresponderia a uma queda de 15% nas tarifas finais e a uma economia média anual de R$ 25,566 bilhões, ou R$ 210 bilhões até 2035.

O estudo da Abraceel que trata dos contratos legados têm prazo de suprimento até 2054. Entre as premissas do estudo estão a descotização progressiva de Itaipu (2024 a 2027) e das usinas da Eletrobras, de 2023 a 2027, além da recontratação das térmicas por meio de leilões de reserva de capacidade.

A avaliação feita por consultorias para modelagem da capitalização da Eletrobras indicou que após a reversão do atual regime, de um total de 50 distribuidoras que possuem cotas de energia das hidrelétricas da estatal, apenas 12 continuarão com sobrecontratação.

Mercado promissor

Atualmente, 35% da energia consumida no país já está no mercado livre e a carga elegível elevaria esse percentual a 40%. “É um percentual muito expressivo, só que essa carga está alocada em apenas 10 mil unidades consumidoras de um universo de 87 milhões”, salientou Rodrigo Ferreira, acrescentando que a liberdade de se escolher o próprio fornecedor da energia está acessível apenas a grandes empresas, sejam da indústria, sejam do comércio.

Quando se olha para a baixa tensão, destacou, os consumidores possuem a opção de ter essa liberdade, de depender das distribuidoras, com a instalação de sistemas de micro e minigeração (MMGD). Só que, reforçou o presidente da Abraceel, essa liberdade não está disponível a toda a população.

Isso porque existe uma série de fatores que podem impedir a instalação, como moradores de prédios (onde a instalação não é tão trivial), casas que sejam alugadas, ou que o telhado não aguente o peso dos painéis, ou ainda que se localizam em áreas de baixa incidência de raios solares. Há também uma grande parte dos consumidores que não têm capacidade financeira ou não querem/não podem suportar financiamentos de longo prazo.

“Várias questões fazem com que a MMGD não seja a opção para todos. Quem tem [centrais solares] já encontra a própria liberdade, mas a maior parte não tem essa liberdade”, frisou.

Comercialização varejista

A proposta do PL 414/2021 prevê que os consumidores com carga de até 0,5 MW possam migrar com a contratação obrigatória de um comercializador varejista, que os representaria perante à CCEE. Ferreira disse não ver gargalo neste tema, uma vez que sem ter o mercado formado já existem 40 comercializadoras habilitadas na câmara para atuar como varejistas, além de mais alguns processos em andamento.

Segundo ele, o número é muito grande no atual cenário, e que vê possibilidade de mais aumento. Porém, nem todas as comercializadoras optarão por abrir um braço varejista, por decisão empresarial. Como exemplo, Ferreira lembrou que há comercializadoras que implantaram usinas de fontes renováveis para comercializar com o mercado; outras optaram por negociar produtos de liquidez ou hedge com comercializadoras; e há empresas que focaram em projetos de GD.

“É mais um dos nichos de mercado”. Ainda de acordo com o presidente da Abraceel, ainda que exista alguma divergência pontual no setor, há a visão clara de um consenso sobre a abertura total do mercado, o que se observa na nota técnica da Aneel divulgada recentemente, que compila as mais de 50 contribuições à tomada de subsídios sobre o tema.