‘Não acreditamos em uma Petrobras privada no onshore’: Diretor da PetroReconcavo (RECV3) afasta tese de consolidação do setor

FONTE: MoneyTimes.

O começo do ano foi bem agitado para as petroleiras juniores. No dia 17 de janeiro, a PetroReconcavo (RECV3) recebeu carta da 3R Petroleum com uma proposta de fusão.

A intenção era criar companhia com US$ 1,1 bilhão em sinergias, 600 milhões de barris de reserva, valor de mercado de R$ 12 bilhões e produção diária de 70 mil barris de petróleo.

A operação animou o mercado. As ações de ambas as companhias dispararam e analistas ficaram eufóricos com a possibilidade. Segundo eles, o acordo fazia sentido, visto que a 3R e a PetroReconcavo compartilham a infraestrutura de poços no Nordeste.

Não custa lembrar que com a mudança de direção da Petrobras (PETR4), que não só parou de vender ativos como pretende investir no setor, as chamadas petroleiras juniores, que cresceram no ‘rastro’ de vendas da companhia durante o Governo Bolsonaro, precisavam se ‘mexer’ e unir forças para melhorar a rentabilidade.

Porém, o negócio foi atravessado por outra petroleira, a Enauta. A união das empresas andou e a 3R formou a Brava (BRAV3). Mesmo assim, ficou no ‘ar’ a possibilidade da PetroReconcavo ser incorporada a essa nova gigante.

Ao que parece, no entanto, o rumor esfriou. “Não há nada planejado no nível de fusão completa entre as empresas”, respondeu Rafael Procaci da Cunha, vice-presidente de finanças e RI da companhia, em entrevista ao Money Times.

Produção onshore diz respeito à extração de petróleo e gás natural a partir de campos situados em terra firme, o contrário da produção offshore, que ocorre no mar.

“Com base na experiência de como a indústria de petróleo se desenvolveu em outros países, como Estados Unidos, Canadá e Colômbia, vemos que o mercado geralmente se organiza com uma pluralidade de empresas”.

Na entrevista, Procaci também fala sobre o mercado de petróleo, a alavancagem e custo de produção da companhia e o futuro da PetroReconcavo.

Veja abaixo:

Money Times: Como fica o mercado de petróleo no Brasil sem o desinvestimento da Petrobras?

Rafael Procaci: Eu acredito que aquela onda de desinvestimentos da Petrobras não deve ser retomada no curto prazo. O que aconteceu, no entanto, é que várias empresas foram formadas para adquirir esses ativos, e agora estamos vendo uma espécie de segunda derivada desse processo, com novas oportunidades de fusões e aquisições (M&A).

No início deste ano, por exemplo, fomos alvo de uma discussão intensa com a antiga 3R, que enviou uma carta propondo uma fusão conosco. Essa negociação resultou em uma fusão da 3R com a Enalta, gerando a Brava.

Temos acompanhado outros desdobramentos semelhantes envolvendo empresas que compraram ativos da Petrobras, o que tem gerado oportunidades de diferentes tipos de arranjos.

Essas possibilidades vão além da fusão de empresas. Muitas vezes, surgem no nível de negócios específicos, como parcerias em campos ou projetos isolados.

Identificamos boas oportunidades nesse sentido. Por exemplo, estamos discutindo com a nova Brava alternativas de parcerias no segmento de midstream, como na planta de gás do Rio Grande do Norte, onde nossas operações são próximas.

Essas negociações têm sido mais focadas em ativos específicos e colaborações pontuais, e não em fusões completas entre empresas. Esse tipo de abordagem abre espaço para explorar sinergias e alavancar oportunidades de negócio sem comprometer nossa estrutura corporativa.

Money Times: Quando a 3R e a Enauta se juntaram e formaram a Brava, a PetroReconcavo também foi colocada como um possível alvo de fusão. Como vocês estão observando essa consolidação no setor?

Rafael Procaci: Nós não acreditamos muito na tese de consolidação que resultaria em uma espécie de “Petrobras privada” no onshore. Com base na experiência de como a indústria de petróleo se desenvolveu em outros países, como Estados Unidos, Canadá e Colômbia, vemos que o mercado geralmente se organiza com uma pluralidade de empresas.

É desafiador para uma única companhia gerir muitos projetos simultaneamente, o que naturalmente cria nichos de especialização.

Algumas empresas se destacam em óleos pesados, outras em óleo leve, ou ainda em áreas específicas como bacias convencionais, não convencionais, gás ou petróleo. Essa diversificação é uma tendência natural baseada nas competências de cada player.

Embora uma consolidação ampla seja improvável, acreditamos em um processo de rearranjo no setor.

Alguns ativos que foram vendidos separadamente, mas são próximos geograficamente, apresentam sinergias operacionais evidentes. Por isso, vemos oportunidades para parcerias, vendas ou aquisições.

Um exemplo é nosso movimento recente de vender participações de 50% em alguns ativos que consideramos menos estratégicos, para uma empresa que já era nossa sócia em outros projetos e que pode desenvolver esses campos com maior eficiência.

Da mesma forma, estamos abertos a adquirir participações em ativos operados por terceiros, sempre buscando fortalecer nossa posição estratégica.

Esse rearranjo será dinâmico, com diversas oportunidades de colaboração entre empresas, mas sem um objetivo final de criar uma grande companhia unificada no onshore.

Money Times: Então, no curto prazo, vocês não acreditam numa fusão com a Brava, certo?

Rafael Procaci: Não há nenhuma tratativa nesse sentido sendo avaliada. Nossa aproximação com a gestão da Brava é bastante grande, e discutimos bastante sobre parcerias em nível de ativos, como projetos de plantas de gás ou operações conjuntas.

Eventualmente, podemos considerar algo relacionado ao desenvolvimento de campos vizinhos, por exemplo. Essas conversas estão ativas, mas não há nada planejado no nível de uma fusão completa entre as empresas.

Money Times: Os preços do petróleo estão em queda no ano; como enxergam o mercado?

Rafael Procaci: No planejamento da empresa, procuramos mantê-la com uma alavancagem baixa para não sermos pegos no momento errado.

Se estivermos com a alavancagem alta, por exemplo, com o preço do petróleo a US$ 90, e ele cair para US$ 50, a alavancagem vai explodir, gerando um problema.

Então, o foco é ter uma estrutura de custo baixa, o que nos permite ser resilientes e sobreviver a ciclos de baixa do preço do petróleo. Com isso, mesmo em cenários de preços mais baixos, conseguimos manter a geração de caixa.

Quando somamos nossos custos de produção, as despesas gerais administrativas e outros custos, o total gira entre US$ 30 e US$ 35 por barril.

Isso significa que conseguimos continuar gerando caixa mesmo em cenários com preços do petróleo mais baixos do que os atuais. Já passamos por períodos longos com o preço do petróleo entre US$ 40 e US$ 50 e, no contexto dos últimos 15 anos, o preço de US$ 70 é relativamente alto.

No pós-pandemia, o petróleo chegou a US$ 100, caiu para US$ 90 e agora está em torno de US$ 70, mas isso não nos preocupa, nem afeta a viabilidade econômica dos nossos projetos.

Money Times: Um dos principais pontos de atenção em relação às petroleiras júniores é o custo de extração, que costuma ser um pouco mais elevado do que o da Petrobras. Como lidam com custo de produção?

Nós quebramos isso em algumas componentes. O principal, como você mencionou, é o custo de produção, o que chamamos de lifting, que é o custo de extrair o petróleo.

No nosso caso, o custo de produção é mais ou menos US$ 13 por barril, o que está em linha com o benchmark no Brasil. Outras petroleiras júniores divulgam números acima de US$ 20, entre US$ 2 0 e US$ 25, na maioria.

Acredito que isso se deve a alguns fatores principais. Primeiramente, já estamos operando campos onshore no Brasil há 25 anos, e com isso temos uma estrutura de gestão madura que foi desenvolvida ao longo do tempo.

Em segundo lugar, fomos bastante seletivos na escolha dos ativos adquiridos da Petrobras, e depois compramos alguns ativos de uma empresa privada.

Esses ativos são bons porque têm petróleo leve e campos com fator de recuperação baixo, com razão água-óleo baixa. Esses indicadores levam a uma operação com custo de produção mais baixo do que outras situações.

Além disso, são ativos em áreas já maduras, com infraestrutura de produção estabelecida, como pipelines e estações de recebimento e tratamento de produção, o que ajuda a manter o custo de produção baixo.

Quanto às despesas gerais administrativas, o overhead da companhia também é baixo. Nosso custo de despesas gerais administrativas é em torno de US$ 4 por barril, enquanto os concorrentes onshore normalmente têm custos acima de US$ 10.

Manter essa estrutura de custo baixa é fundamental para atravessar os ciclos de altos e baixos com resultados consistentes.