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Solar e eólica são 93% da energia nova até 2029

Expansão da geração intermitente aumenta a preocupação sobre a segurança do sistema

FONTE: Valor Econômico

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A expansão da geração de energia elétrica no Brasil seguirá sendo puxada pelos projetos de usinas eólica e solar (fotovoltaica) nos próximos anos. Dados de julho indicam que as duas fontes representam 93% dos 129,5 gigawatts (GW) de acréscimo na capacidade de geração do país, com entrada em operação programada entre 2023 e 2029. Estes empreendimentos somam investimentos de R$ 424 bilhões.

De acordo com levantamento da Abraceel, entidade que representa as comercializadoras de energia, as usinas eólicas e solar aumentaram este ano a participação no conjunto de novos projetos em 11 pontos percentuais em relação ao ano passado.

Os investidores do mercado livre, onde os grandes consumidores podem escolher de quem comprar energia, respondem por 92% dos projetos que serão concluídos até 2029.

O boom de investimentos para garantir o aproveitamento da força dos ventos e da radiação solar, especialmente no Nordeste, é comemorado por reforçar a base de geração de energia limpa.

O Brasil já ocupa posição de destaque na geração de energia limpa, por conta da grande oferta de energia por hidrelétricas (52,2% da matriz). Agora, o país reforça sua vocação com a rápida expansão das usinas eólica e solar. Estas fontes, porém, consideradas de geração intermitentes, mudam a dinâmica de operação do sistema.

A oscilação na entrega de energia ao Sistema Interligado Nacional (SIN) é causada pelas variações constantes do vento e das eventuais passagem e permanência das nuvens sobre painéis solares. Essa instabilidade mexe com o comportamento de duas grandezas físicas que trabalham em equilíbrio para dar confiabilidade ao fornecimento de energia: a tensão e a frequência na rede.

“É assim que está acontecendo nos Estados Unidos, na Europa e também no Brasil”, admite Luiz Carlos Ciocchi, diretor-geral do Operador Nacional do Sistema (ONS). “É inexorável, é assim que caminha”, complementou.

Atualmente, o ONS concentra esforços na apuração e na busca das causas do apagão de grandes proporções que ocorreu no último dia 15 atingindo 25 Estados e o Distrito Federal. A única informação divulgada oficialmente, até este momento, é que o incidente teve início com o desligamento da linha de transmissão no Ceará, com aparente falha na resposta do sistema de proteção da rede básica que não evitou o contágio de todo o sistema.

Do ponto de vista de infraestrutura, acompanhamos o que há de melhor” — Luiz Ciocchi

Desde o blecaute deste mês, especialistas passaram a ser questionados se o sistema elétrico brasileiro é capaz de domar a oferta intermitente de energia das fontes renováveis.

“Temos historicamente no ONS um dos melhores corpos técnicos de engenharia elétrica do mundo, que vem se atualizando permanentemente. Do ponto de vista de infraestrutura, de modelos [de operação] e de sistemas, também temos acompanhado o que há de melhor no mundo. Então, estamos bem preparados para esses desafios”, respondeu Ciocchi, ao Valor.

O diretor do ONS ressalta que, apesar de manter engenheiros, equipamentos e softwares “sempre atualizados”, nenhum sistema está totalmente livre de falhas.

“Isso não nos livra de contratempos. Muitos dos progressos ocorridos – não só no setor elétrico, mas em todas as áreas do conhecimento humano – vem exatamente quando você chega num limiar, no limite do conhecimento que a partir daí você tem o ‘evento’. Aí, então, você aprimora”, disse.

Os investidores do mercado livre continuam demonstrando muito interesse em aumentar participação na geração apesar do preço de referência da energia negociado no mercado de curto prazo se manter próximo do limite mínimo de R$ 69 por megawatt-hora (MWh), reflexo dos reservatórios cheios das hidrelétricas e baixa demanda por energia relacionada ao desempenho tímido da economia.

“Os investimentos em geração de energia no Brasil são de longo prazo. Os investidores não olham para os preços só de curtíssimo prazo. O mercado não vai ficar com esse preço para o resto da vida, é evidente. Nossos projetos consideram um horizonte de 30 anos”, disse Rodrigo Ferreira, presidente da Abraceel.

De acordo com o executivo, 165 mil unidades de consumo poderão migrar para o mercado livre no ano que vem, e parte deles já manifestaram interesse em exercer esse direito. Hoje, eles têm o fornecimento feito exclusivamente pela distribuidora local, no chamado mercado regulado.