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Gás disponível para química e fertilizantes pode alcançar até 25 milhões de m3/dia, diz PUC
Estudo encomendado pela Coalizão pela Competitividade Gás Natural mostra que, sem novas demandas, mercado não absorverá choque de oferta
FONTE: EPBR
RIO – Se o Brasil não criar novas demandas para o gás natural, o choque de oferta esperado para os próximos anos será motivo de dor de cabeça para os produtores.
Um estudo lançado esta semana pelo Instituto de Energia da PUC-Rio mostra que, mesmo num cenário conservador, sem novas rotas de escoamento no pré-sal, entre 8 milhões de m3/dia e 17 milhões de m3/dia de gás firme poderão ficar sem mercado a partir de 2028.
Esse é o volume que poderia ser orientado para novos projetos no setor químico e de fertilizantes, como defende a Coalizão pela Competitividade Gás Natural.
Num cenário em que haja investimentos na infraestrutura de escoamento e processamento, para eliminar gargalos, esse volume de gás sem mercado – e disponível para um programa de estímulo à produção de fertilizantes e à indústria química – sobe para entre 12 milhões e 25 milhões de m3/dia.
O trabalho do IE-PUC foi encomendado pela Coalizão, liderado pela Abemi (engenharia industrial), e será apresentado na quinta (27/7) ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD) – entusiasta do programa Gás para Empregar, que promete um aumento da oferta de gás a preços competitivos para reindustrialização do país e que tem nos setores químico e de fertilizantes uma de suas prioridades.
O estudo considera a entrada em operação, nos próximos anos, de três novas grandes fontes de gás nacional:
- o Rota 3, no pré-sal da Bacia de Santos, previsto para 2024;
- o BM-C-33 (Bacia de Campos), para 2028;
- e Sergipe Águas Profundas, também para 2028.
Fertilizantes como novo âncora
Pelas características da produção nacional, fortemente associada ao petróleo, o gás brasileiro é essencialmente um gás firme – e que não dialoga com o comportamento flexível da demanda termelétrica, destaca o estudo.
Além disso, como tem havido dificuldades na contratação de novas usinas, como âncoras para novos investimentos em gasodutos, o estudo defende a importância de se pensar em novas demandas firmes.
“Olhamos o seguinte: o gás brasileiro é um gás associado [ao petróleo], é um gás firme. Então ele não serve para atender térmica flexível, que pode ficar sem despachar, às vezes, até por anos. Então essa térmica flexível não tem jeito, tem que ser com GNL [gás natural liquefeito]”, comenta o professor do IE-PUC, Edmar de Almeida, um dos autores do estudo, em entrevista à agência epbr.
A pesquisa acrescenta que, em todos os cenários projetados, a demanda industrial não será suficiente para absorver o crescimento da oferta.
“Se tiver mais oferta firme do que gás firme, tem uma questão para discutir, porque esse é um problema para os produtores. Principalmente para a Petrobras”, afirma Almeida.
“Essa é uma questão de planejamento energético que o estudo está colocando: como vamos criar demanda com esse gás que está chegando?… Isso é um problema para todo mundo, principalmente se começa a ter um um uma guerra de preço, que pode chegar a inviabilizar muitos negócios”, complementou.
Estudo aponta gargalos
Num cenário menos conservador, em que haja investimentos na infraestrutura, um volume de até 25 milhões de m3/dia estará, a partir de 2028, sem mercado.
O estudo identifica alguns desses gargalos: um deles é a Unidade de Tratamento de Gás Monteiro Lobato, unidade de processamento de Caraguatatuba (SP), que não tem capacidade de separação dos líquidos do gás rico do pré-sal e já não consegue atender à especificação do gás – com um nível mínimo de 85% de metano.
Em 2020, a Petrobras cancelou o projeto de adequação da unidade “devido à perda de atratividade econômica do projeto”.
Em paralelo, a estatal pleiteia na Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) a liberação das regras de especificação do gás natural – o que, na prática, lhe permitirá escoar mais “gás seco” por Caraguatatuba.
Outro gargalo é a própria capacidade de escoamento da Rota 1 até Caraguatatuba. O gás do pós-sal injetado no Rota 1 está em declínio e o trecho entre os campos de Uruguá e Mexilhão está ocioso.
“O Rota 1 representa uma oportunidade [de novos investimentos]. Não é de curto prazo, fazer uma nova UPGN (…) Então estamos apontando alguns gargalos, mas que se começar agora vai ter resultado daqui a alguns anos, estamos falando em 2027 ou 2028”, comenta Almeida.
O debate sobre a reinjeção
O volume de gás disponível no mercado dependerá, claro, da estratégia dos operadores quanto à reinjeção.
O estudo do IE-PUC conclui que uma parcela importante da produção brasileira não chega ao mercado devido à reinjeção econômica – como os pesquisadores chamam a aquela parcela de gás usada para aumentar a recuperação de óleo nos reservatórios e que não deve ser confundida, na visão dos autores, como a reinjeção técnica, para separação do CO2.
Essa diferenciação, recentemente, também tem sido encampada pelo Ministério de Minas e Energia e se contrapõe, assim, à Petrobras – que, no debate público sobre o assunto, frequentemente associa a reinjeção para recuperação secundária de óleo como técnica.
De acordo com o estudo do IE-PUC, 29% do gás reinjetado diz respeito a volumes que contém alto teor de CO2 e 24% ocorre em razão do chamado gás de arrasto (parcela que é permeada junto às membranas separadoras de CO2). Ou seja, mais da metade do gás reinjetado se dá por razões técnicas.
Portanto, segundo o trabalho, 47% do volume reinjetado atualmente – ou cerca de 30 milhões de m3/dia – poderia vir para o mercado. É o que os autores chamaram de gás em potencial – uma soma da reinjeção feita para aumento do fator de recuperação de petróleo; de gargalos no escoamento; e ausência de capacidade de separação do CO2 em algumas plataformas, como as do campos de Mero.
Almeida explica que o estudo não tenta quantificar os volumes que, de fato, compõem a reinjeção econômica, devido à falta de dados dos projetos. Para se ter um cenário de oferta ajustado que considere a reinjeção econômica é fundamental uma articulação das autoridades com os órgãos reguladores competentes, defende.
O professor vê, nos números apresentados, um ponto de partida para a discussão do Gás para Empregar.
“É um uma conversa que é muito técnica e que as empresas têm que encontrar o caminho para discutir isso com o governo e dar transparência. Porque se não essa conversa não vai ter como encaminhar para um nível de entendimento”, comenta.
A Petrobras alega, por sua vez, que 80% do volume reinjetado é para recuperação de petróleo e para separação de CO2. Outros 10% da reinjeção diz respeito aos volumes do Polo Urucu, no Amazonas, devido à falta de mercado na região Norte; e outros 10% estão represados por conta do atraso do Rota 3.