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Vale do Jequitinhonha ingressa na rota do lítio

Além da Sigma, cinco mineradoras estrangeiras investem R$ 1,5 bilhão na região

FONTE: Diário do Comércio

De Araçuaí*

O Vale do Jequitinhonha entrou mesmo na rota do lítio e já começa a ser conhecido globalmente como lithium valley. Além da Sigma Lithium, que está investindo R$ 3 bilhões na implantação de um complexo de produção e beneficiamento de concentrado de grau bateria de alta pureza, outras empresas estrangeiras já começam a chegar à região para extrair e tratar o insumo usado na fabricação de baterias.

Pelo menos outras cinco mineradoras com origem em países diretamente concorrentes do Brasil na corrida pelo mineral, como Austrália, Canadá e Estados Unidos, estão investindo R$ 1,5 bilhão em projetos em cidades como Salinas e na própria Araçuaí. Lithium Resources, Lithium Ionic e Atlas Lithium são algumas dessas empresas que, conforme a CEO da Sigma, Ana Cabral, já encontram a região e o produto com outro valor de mercado.

“São empresas com US$ 100, US$ 200, US$ 300 milhões de dólares de capitalização. Para a Sigma chegar a esse valor demorou um tempo. Elas largam com a vantagem que a Sigma criou; e temos muito orgulho disso. Essas empresas já saem de uma patamar mais avançado, porque não têm que estabelecer a região. A gente teve que quebrar o ceticismo, porque não era uma região conhecida na cadeia de produção, hoje já sabem que é um colosso e todos querem ser a próxima Sigma”, afirmou durante encontro com a imprensa na planta.

Para se ter uma ideia, a companhia que possui ações na Bolsa de Toronto, no Canadá, e na Nasdaq, saltou de US$ 1,6 bilhão em abril para US$ 5,1 bilhões em maio de 2022, graças à demanda crescente pelo insumo de baterias diante da transição energética global e ao modelo ambientalmente sustentável proposto pelo empreendimento, que promete ser a primeira unidade greentech do setor mineral no mundo. Ao fim do ano que passou, a empresa liderava o ranking Venture 50 da Bolsa de Toronto com capitalização de 250% no decorrer do exercício. A mineradora apurou aumento de 193% no preço de suas ações no mesmo período.

Complexo tem previsão de iniciar operações já no mês que vem | Crédito: Mara Bianchetti

Montadoras se interessam por negócio da Sigma

Tamanha robustez e versatilidade têm atraído o interesse de investidores de todos os portes e cantos do mundo. E não apenas de investidores tradicionais do setor de commodities, mas também de gigantes do setor automotivo, em busca de garantir suprimento para suas fábricas, a exemplo da Tesla, do bilionário Elon Musk, e outras montadoras chinesas, como a BYD.

Questionada sobre todo esse assédio, Ana Cabral disse que seria uma honra fazer negócios com essas marcas. “Mas não agora. É preciso segurar, porque o valor da empresa agora é um, daqui a pouco será outro. O produto da Sigma vai chegar a US$ 7 mil a tonelada, enquanto o lítio bruto chega no máximo a US$ 70. Agora todo mundo quer, porque é um empreendimento barato diante de todo seu potencial. Seria inacreditável, até porque o poder de transformação dessas empresas para a região do Jequitinhonha é muito maior que o nosso. É muito bom, mas não agora”, reforçou.

Justamente pelo preço do lítio grau bateria que a mineradora vai comercializar são grandes as expectativas acerca dos resultados das operações, que estão previstas para serem iniciadas no próximo mês. Antes, porém, a Licença de Operação (LO) precisa ser aprovada e já está na pauta da reunião do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), órgão colegiado subordinado à Secretaria de Estado Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), prevista para o dia 31 de março.

Ocorrendo tudo dentro da previsão da companhia, a primeira fase do empreendimento, batizado de Grota do Cirilo e que fica entre os municípios de Itinga e Araçuaí, começa a rodar já no próximo mês e, paralelamente, já são iniciadas obras para implementação das fases 2 e 3.

CEO Ana Cabral apresentou complexo na última sexta-feira | Crédito: Mara Bianchetti

Sigma passará de 6º para 4º maior produtor global em um ano

A primeira etapa prevê a produção de 277 mil toneladas ao ano do insumo e recebeu investimentos da ordem de R$ 1 bilhão. A segunda elevaria esse volume para 440 milhões toneladas ao custo de outro R$ 1 bilhão a ser aportado no decorrer de 2023, para operação em 2024. Mas tamanha aposta diante da demanda do mercado fez com que a empresa antecipasse os planos e anunciasse mais R$ 1 bilhão ainda para este exercício, permitindo com que a fase 3 seja implementada paralelamente à 2, totalizando, em meados do ano que vem, 670 mil toneladas anuais.

“Quando aprendemos que não tinha concorrente, justamente pelos diferenciais do produto e suas características sustentáveis, ao invés de implementarmos a fase 2 e planejar a 3, até então prevista para 2026, decidimos aproveitar a oportunidade competitiva e vamos fazer as duas linhas de uma vez. Assim, em 2024 vamos ter tudo que era para 2026, o que vai nos permitir sair da posição de sexto maior produtor do mundo – com mais de 270 mil toneladas – para quarto maior produtor – com 670 mil toneladas/ano. A ideia é fazer o máximo antes da concorrência conseguir replicar nosso modelo industrial”, explicou.

Assim, como a empresa estima produzir até dezembro, por baixo, cerca de 100 mil toneladas, a previsão é que o faturamento chegue próximo a R$ 3 bilhões em 2023. Descontando os custos, o lucro líquido seria da ordem de R$ 2 bilhões, o que, conforme a executiva, permitiria já recuperar parte do investimento realizado, já que há ainda uma inflexão do mercado. Segundo ela, o timing do investimento e da construção do empreendimento foi fundamental para isso.

“Esse valor que hoje está em US$ 6 mil já foi US$ 500, devido a um excesso de estoque no mercado. Por isso eu digo que o lítio não é raro. O ponto não está no insumo, mas em sua transformação. Quando percebemos que o preço estava naquele nível, avaliamos que, industrialmente, a única forma de recuperar o investimento era agregando mais valor. Foi aí que decidimos refinar nossos processos industriais até o nível pré-químico, avançando ainda mais para dentro da cadeia”, revelou.

E o resultado vai ser conferido de perto inclusive por autoridades federais no início de maio, quando está previsto um novo evento na unidade, desta vez marcando os primeiros embarques do produto. Até mesmo o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) deve marcar presença, de acordo com Ana Cabral, “porque esse é o modelo de industrialização verde que o Brasil quer”.

Sigma promete entregar 1ª planta industrial greentech do setor mineral | Crédito: Mara Bianchetti

O que faz a operação da Sigma ser sustentável

A Sigma promete entregar a primeira planta industrial greentech do setor mineral do mundo. Entre os atributos que permitem essa classificação, equipamentos e tecnologia de última geração somados a ações sustentáveis do ponto de vista econômico, social e ambiental.

“Não há consequências nocivas para o meio ambiente. É uma planta zero barragem, zero rejeitos, zero químicos nocivos, com 100% de reúso de água, 100% de energia limpa, com emissões mínimas de carbono e também engajada socialmente. Estamos, de fato, transformando o Vale do Jequitinhonha. Mudando a vida das pessoas da região”, ressaltou a CEO da Sigma, Ana Cabral.

Entre as iniciativas no campo social, destaque para o programa Dona de Mim, do Grupo Mulheres do Brasil, que oferece microcrédito para pequenas empreendedoras e que já está sendo ampliado. A empresa anunciou que o projeto investirá em 10 mil mulheres do Vale do Jequitinhonha que têm dificuldade de acesso a linhas de crédito do sistema financeiro regular, oferecendo empréstimos de até R$ 2 mil. Atualmente, 500 empreendedoras nas cidades de Itinga e Araçuaí já são contempladas.

Na última quinta-feira (23), o governador Romeu Zema (Novo) esteve na unidade e acompanhou de perto o anúncio da expansão da proposta. Na ocasião, também foi anunciado o investimento de R$ 4,5 milhões na construção de 2 mil reservatórios de captura de água da chuva para atender pequenos agricultores sustentáveis de Araçuaí e Itinga, durante o período de estiagem.

Ainda para colaborar com a segurança hídrica na região do projeto, a empresa doará 3 mil caixas d’água para moradores aos arredores da planta.

*A repórter viajou a convite da Sigma Lithium