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Triunfo tenta ‘arrumar a casa’ e voltar a crescer

Grupo de infraestrutura ainda terá que vencer desafio de renegociar dívidas e vencer brigas judiciais para obter indenizações

FONTE: Valor Econômico

Há cerca de dez anos, a Triunfo Participações e Investimentos (TPI) conquistava a concessão do aeroporto de Viracopos (SP), e se preparava para fazer novos investimentos no setor de infraestrutura. De lá para cá, o grupo viu seus planos de expansão darem lugar a imbróglios judiciais intermináveis e reestruturações de dívidas conturbadas. Entre ativos vendidos, concessões que chegaram ao fim e contratos em processo de devolução, o portfólio da companhia vem minguando. Por outro lado, o grupo tem conseguido firmar acordos com credores, obtido decisões judiciais favoráveis e começa a falar novamente sobre novos negócios.

O caminho para tentar voltar a crescer já está definido. O plano seria investir em terminais no Porto de Santos, segundo fontes próximas ao grupo. A TPI tem dois projetos de Terminais de Uso Privado (TUPs) na margem esquerda porto. Um deles, o TPL (Terminal Portuário Logístico), recebeu autorização do governo federal em maio deste ano. O segundo, o Terminal Brites, que tem aval desde 2015, ficou anos travado por uma ação civil pública, que apontava danos ambientais. Em 2021, o projeto conseguiu a liberação para seguir adiante.

No entanto, para além das dificuldades de tirar do papel os terminais, o grupo ainda tem o desafio de “arrumar a casa” antes de voltar a falar em crescimento. Isso significa concluir a reestruturação de suas dívidas e obter vitórias judiciais que garantam o recebimento de indenizações – necessárias para reabastecer o caixa da companhia. A avaliação de uma fonte é que a empresa passará ao menos mais um ano “olhando apenas internamente”.

A reestruturação das dívidas está encaminhada, segundo uma pessoa próxima à empresa. Em 2020, a TPI sofreu um duro revés, quando a Justiça anulou a homologação de sua recuperação extrajudicial. O grupo ainda recorre da decisão, mas desde então tem conseguido firmar acordos bilaterais com seus credores.

A maior pendência ainda é o BNDES. Como a TPI aceitou devolver duas concessões (Concebra e Viracopos) que têm o banco de fomento como credor de peso, uma parte da discussão está encaminhada. Mas resta fechar o acordo para os créditos referentes a outra concessão rodoviária, a Concer. Além disso, o grupo quer aproveitar o bom momento de Viracopos para antecipar pagamentos da dívida. Para isso, também negocia retirar a obrigação de compensação financeira em caso de quitação antecipada.

Procurado, o presidente da TPI, Carlo Alberto Bottarelli, afirmou que a empresa tem quitado todos os compromissos. “Nós não demos um centavo de calote. Pagamos todas as nossas dívidas”, disse. O BNDES não quis comentar.

Mesmo com os acordos, o grupo ainda terá o desafio de reconquistar a confiança das instituições de crédito. A percepção no mercado é que, apesar do desgaste com bancos, há financiadores dispostos a emprestar à TPI – evidentemente, a um custo mais alto e com uma estrutura de garantias mais robusta.

Em março deste ano, o grupo (por meio da concessionária Transbrasiliana) voltou a acessar o mercado de capitais, com uma emissão de debêntures no valor de R$ 275,4 milhões, com remuneração de IPCA + 9,6% e vencimento em 2033 – mesmo prazo da concessionária. Em garantia, foram dadas as ações e recebíveis dos dois ativos mais “saudáveis” do grupo: a Transbrasiliana e a fatia de 50,1% detida na Tijoá (usina hidrelétrica de Três Irmãos).

A TPI tem outras três concessões: a Concer (Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora-Rio de Janeiro); a Concebra (Concessionária das Rodovias Centrais do Brasil); e Viracopos. A Concer está em fase final – o contrato teria se encerrado em fevereiro de 2021, mas foi prorrogado por mais 717 dias por decisão liminar. Os dois últimos ativos estão em processo de devolução ao governo, para relicitação.

Outro grande desafio da TPI é a resolução dos muitos imbróglios jurídicos. Quase todas as concessões do grupo travam duras batalhas com órgãos reguladores por reequilíbrios econômico-financeiros. O tema é essencial, já que a empresa conta com os recursos pleiteados para voltar a investir.

No último ano, a companhia obteve algumas decisões liminares favoráveis e bastante importantes, como a prorrogação da Concer até 2023 e o aumento da tarifa de pedágio da Concebra.

A maior briga, porém, é a do aeroporto de Viracopos. A TPI detém uma participação indireta de 35% na concessão, junto à UTC, à francesa Egis e à estatal Infraero. A concessionária passou por uma recuperação judicial turbulenta, iniciada em maio de 2018 e encerrada no fim de 2021, quando a empresa aceitou devolver o ativo.

Hoje, no entanto, o acordo está ameaçado. A companhia, que só concordou com a devolução após forte pressão do governo federal, estuda interromper o processo.

A briga é em torno da indenização (pelos investimentos feitos e não amortizados). O governo quer leiloar o aeroporto o quanto antes e jogar parte do pagamento para depois da transferência do ativo ao novo operador. Já a empresa diz que só concordou com a devolução sob condição de receber o ressarcimento antes da transferência. A companhia calcula ter R$ 4,6 bilhões a receber. A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) ainda não apresentou sua conta. A discussão está em arbitragem, sem prazo para acabar.

Em paralelo a todos os imbróglios, a TPI começa a se movimentar para viabilizar novos projetos – os dois terminais em Santos. Estima-se que cada um deles demandaria investimento de ao menos US$ 600 milhões. A vocação do projeto está em aberto. Há a ideia de fazer usos múltiplos, com granéis sólidos, líquidos e fertilizantes. Porém, tudo dependerá de parceiros – idealmente, um grupo “dono da carga”, disposto a firmar acordo de take-or-pay [em que o pagamento se dá independentemente do volume].

Entre fontes do mercado, a percepção é que sem um sócio capitalizado os planos são inviáveis. Além disso, há a complexidade de tirar do papel empreendimentos “greenfield” [construídos do zero], sem licenças ambientais definitivas e com incertezas quanto à viabilidade. Um ator do setor portuário observa que, diante dos investimentos que têm sido feitos em Santos, é difícil enxergar, neste momento, demanda que justifique uma obra tão cara.

Questionado sobre os diversos desafios do grupo, o presidente da TPI se diz confiante na retomada. “[Durante a crise,] a gente se fechou. Abaixamos a vela, nos agarramos ao mastro e passamos a tempestade. Foram cinco anos difíceis. Hoje estamos voltando mais fortes”, afirmou Bottarelli.