Mercado livre de energia já pode ter mais 70 mil clientes

FONTE: Valor Econômico

Segundo estudo da CCEE, esse é o número de consumidores no país que poderia migrar do fornecimento cativo

Uma das principais bandeiras do setor elétrico, a abertura do mercado livre de energia a todos os consumidores, segue em discussão no Congresso, mas o potencial de crescimento, dentro dos limites atuais, ainda não se esgotou.

Segundo um estudo da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), antecipado ao Valor, existem 70 mil unidades consumidoras que já poderiam migrar para o modelo de compra de energia diretamente de um gerador ou comercializadora, negociando contratos mais flexíveis e, geralmente, com preços mais favoráveis se comparados aos do mercado cativo, das distribuidoras.

São empresas de diferentes portes – principalmente pequenas indústrias e shopping centers -, que, sozinhas ou em comunhão, alcançam carga acima de 0,5 megawatt (MW), o mínimo pra poder ingressar no chamado ambiente de contratação livre (ACL). Juntas, essas unidades consomem 5.000 MW médios. Se migrassem, elevariam a participação do mercado livre no Sistema Interligado Nacional (SIN) dos atuais 32% para 40,2%.

Para a vice-presidente do conselho de administração da CCEE, Talita Porto, o que falta para que essas empresas tomem a iniciativa de aderir ao mercado livre é uma maior oferta de produtos específicos para consumidores de pequeno porte. “São consumidores que não têm equipe especializada em fazer gestão de energia, então precisam de uma figura que faça isso por eles”.

Chamado de “varejista”, o mercado para atender pequenos consumidores de energia vem crescendo aos poucos, mas ainda não deslanchou. O número de elétricas interessadas em operar nesse nicho vem aumentando: hoje, 36 de um total de 433 comercializadoras estão habilitadas pela CCEE a atuar como varejista, numa lista que inclui AES, Omega, Engie, EDP, Cemig e Compass. “Vemos um crescimento da quantidade de habilitações, de 7 no ano passado para 12 neste ano. Mas não vemos a efetiva utilização desse produto como gostaríamos”, afirma Porto.

A conselheira da CCEE defende aprimoramentos regulatórios para os agentes varejistas, de forma a estimular a ampliação do mercado. Uma das dificuldades enfrentadas é o maior risco atrelado a essas operações, o que encarece o produto. “A lei 14.120/2021 trouxe um certo conforto jurídico, garantindo que esses consumidores vão ter o fornecimento de energia suspendo em caso de inadimplência. Essa era uma demanda do lado do mercado, principalmente dos comercializadores”.

Os limites de carga para entrada no mercado livre vêm se reduzindo progressivamente desde 2018 e, hoje, a operação é autorizada para consumidores de alta tensão que tenham uma carga mínima de 0,5 MW. De acordo com os últimos dados consolidados da CCEE, o ACL fechou o mês de agosto com 9.580 consumidores livres e especiais, quantidade 18,2% maior que a de igual período de 2020.

A CCEE calcula que, quando o processo de abertura do mercado avançar, mais 11, 47 milhões de consumidores poderão migrar num primeiro momento. Esse universo contempla a potencial adesão de 175 mil unidades do grupo A, ligados na alta tensão, e 11,3 milhões do grupo B, de baixa tensão, excluindo as residências. Caso todos esses consumidores migrassem, a participação do ACL no consumo nacional de energia atingiria 59,1%.

Para que se possa evoluir para uma abertura ampla, e até total, do mercado livre, inclusive para os consumidores residenciais, o setor elétrico discute e aguarda, há anos, a aprovação de projetos de lei no Congresso que tratam da modernização do setor. Dois desses projetos ganharam movimentações nas últimas semanas: o PL 1.917/2015 e o PL 414/2021 (ex-PLS 232/2016).

“Os dois PLs têm propostas muito semelhantes. A modernização do setor é uma proposta de estado, não de governo, e vai se configurar, porque todo o mercado quer”, ressalta Porto. “Alguns dos processos de modernização, como estudo de preço por oferta, são mais longos, outros são mais curto, mas tudo está andando em paralelo, e essa orquestra o Ministério está conduzindo”.

A CCEE e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) devem entregar ao Ministério de Minas e Energia (MME), até janeiro de 2022, um estudo completo com medidas regulatórias e um cronograma para a abertura do mercado a consumidores com carga abaixo de 0,5 MW.